segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Niver: 1 ano de Culinária e Magia

Só hoje me dei conta que, ontem fez um ano do blog. Antes tarde, do que nunca! Fiquei pensando como foi o desenrolar desse ano de blog. O primeiro que realmente me dediquei, vibrei com cada post, coloquei o melhor de mim aqui. No início não sabia que linha seguir, sobre o que exatamente iria escrever. Sabia que tinha duas paixões muito bem alinhadas na minha vida: comer e ser bruxa. Sabia também, do quanto é possível e agradável unir essas duas categorias num caminho paralelo, através de um universo mítico e lúdico, capaz de me fazer pensar sobre o que como, do que gosto, do que desconheço e do que me traz prazer. A verdade é que o blog aconteceu. O blog serviu como uma espécie de "vigilantes do peso" na minha vida. Nos primeiros meses, pude perder alguns quilos apenas postando e pensando no que como e porque como. Funcionou! Estive em alerta durante meses, preocupada com a saúde, através da boca. E que boca nervosa tenho eu...rs! Repensei a cultura culinária da minha família, vinda através da minha mãe, dos hábitos que ela tinha e seus anseios pessoais, dos padrões que carreguei através dos anos e tenho chance de mudá-los, porque agora, os conheço. Mas não foi sempre assim durante o ano. Na verdade por um bom tempo, esmoreci, falhei, embora não me culpe e seja capaz de assumir isso. Ganhei alguns quilos perdidos, comi mais do que precisava ou devia e isso se deu no fim do ano agora. Desculpinha à vista: foi o Natal e Ano Novo...rs! Não há como fechar a boca nessa época. Agora o ano começa de fato e vou dar um restart na proposta inicial do blog. Pensar e comer; comer e pensar. Palavra de bruxa!
E o primeiro pedaço desse bolo vai para todos seguidores que, surgiram de vários lugares. Alguns desses 11 fiéis seguidores eu conheço, outros não. Vai também para todos que já deram um clickzinho por aqui, leram ou ensaiaram ler algum dos posts. Valeu gente, vai ter mais!

Cuidado com a tacocracia - Mario Sergio Cortella

Estou lendo o livro do filósofo e educador Mario Sergio Cortella, "Não Nascemos Prontos - provocações filosóficas" e pensando nas ligações entre comida e magia. Em seu terceiro capítulo,"Cuidado com a tacocracia", sua abordagem diz respeito a pressa que existe no mundo contemporâneo e a necessidade de se vencer o tempo. Abaixo reproduzirei na íntegra o capítulo. Fiquei imaginando um mundo tão rápido e sem tempo hábil para quase nada: comer bem, dormir relaxadamente, pensar, divertir, viver o ócio e etc., parece-nos impossível nesses tempos de pressa de uma sociedade que "precisa" vencer os desafios do tempo e se organizar cada dia melhor. Em postagens anteriores desse blog já tratei do assunto dos fast-food, da pressa e da saudade dos antigos e demorados almoços em família. Para a sociedade de consumo, "tempo é dinheiro" e a demora num restaurante parece ilícita e imoral. A criação das redes de comida rápida, mesmo sem sabor ou qualidade, foi conveniente aos apressadinhos de plantão, que precisam bater metas absurdas, estabelecidas por suas empresas e mostrar produção a todo instante. Tudo isso me levou a pensar se não tivermos mais tempo disponível, como seria um fast-ritual, ou uma fast-magia da culinária? Eu sei que há pouco tempo para cozinhar em casa, pouco tempo para enfrentar as filas dos supermercados, feiras livres ou sacolões. Apenas quero reforçar a idéia de que num mundo que tem tanta pressa, para nós bruxas e bruxos não há como se adiantar. Na magia cada etapa tem sua importância para o resultado final e não há como dizer: farei um ritual rapidinho e já volto. Na magia temos que desacelerar, respirar, beber água e colocar a mão na massa ou no nosso altar e em seus instrumentos sagrados. Conectar-se com o divino requer tempo, dedicação e emoção. Coisas que o "fast world" não vai conseguir destruir nas nossas práticas, eu assim espero!


Cuidado com a tacocracia...


Se você não se cuidar, a tacocracia vai te pegar!

Os antigos gregos , avós da cultura ocidental, quando usavam o termo tákhos (rápido) para expressar uma característica ou a qualidade específica de algo, não poderiam imaginar que um dia seus herdeiros fôssemos capazes de escolher a velocidade como o principal critério de qualidade para as coisas em geral. Estamos próximos, muito próximos, de uma tacocracia, na qual a rapidez em todas as áreas aparece como um poder quase despótico e como exclusivo parâmetro para aferir se alguma situação , procedimento ou relação serve ou não serve, é boa ou não. A pressa não é mais inimiga da perfeição? Devagar não se vai mais ao longe? Há, ainda, algum valor que possa ser atribuído a algo que demora um pouco mais para ser feito, fruído ou conquistado? Não; não temos mais tempo! Cada dia levantamos mais cedo e vamos dormir mais tarde, sempre com a sensação de que o dia deveria ser mais extenso ou não soubemos nos organizar direito. Nem o relógio olhamos mais para ver que horas são, mas, isso sim, para verificar "quanto falta". É essa urgência de visualizar o intervalo espacial entre os ponteiros que fez, por exemplo, com que os relógios de pulso digitais não obtivessem sucesso duradouro, pois precisam ser lidos, em vez de apenas percebidos de relance; hoje, só os usam os que têm algum tempo sobrante para fazer cálculos.

Vai demorar para ficar pronto? Vou demorar para aprender isso? A conexão é demorada? A leitura desse livro é demorada? A visita ao museu é demorada? O culto é demorado? Aprender a tocar esse instrumento é demorado? Cuidar mais do corpo é demorado? Demora para fazer essa comida? Então não posso querer. Será um exagero pensar que estamos sendo invadidos pela tacocracia? Bem, lembremos somente uma situação modelar: a alimentação. Embora não seja uma das maiores fontes de prazer e convivência para nossa espécie, querem que eu, o tempo todo (em vez de ser opção eventual), procure um tipo de comida em função da qual não precise pensar muito para selecionar - posso numerá-la, no lugar de nomeá-la - e, claro não espere além de um minuto para recebê-la. Ademais, essa comida deve ter uma consistência que me permita dispensar o trabalho de mastigar muito, podendo comê-la com as mãos, após ser tirada do interior de um saco de papel. O melhor de tudo é que eu consigar fazer isso sentado em fixos banquinhos desconfortáveis (diante de incomôdas mesas) ou, como ápice civilizatório, dentro do carro, enquanto dirijo. É prático, sem dúvida. Mas, é bom? Possibilita que eu ganhe tempo, mas, o que faço com o tempo que ganho? Vou desfrutar mais lentamente outras coisas ou continuo correndo? Tem alguma coisa errada nessa turbinação toda. Afinal, para além dos gregos que traímos, vamos pelo menos respeitar os latinos, para os quais curriculum vitae significava o percurso da vida, e não a vida em correira...

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Happy Valentine's Day !!!

The New York Times 14/02/2010

Comidas afrodisíacas não tem respaldo científico Sarah Kershaw

Casais que pretendem levar o jantar do Dia de São Valentim [o dia dos namorados nos EUA e Europa] a uma conclusão satisfatória podem ficar tentados pelo menu especial oferecido pelo restaurante One if by Land, Two if by Sea em Manhattan e, em particular, pela sobremesa Floresta Negra. É uma barra de brownie de chocolate e pistache com palitinhos de chocolate merengue, creme fresco, sorvete, gel de cereja e cerejas doces. Mas atenção! Um estudo descobriu que o cheiro das cerejas diminui significativamente o desejo sexual nas mulheres. Há outro problema com a Floresta Negra e as zilhões de outras formas de chocolate que serão consumidas neste fim de semana: a reputação do chocolate como afrodisíaco é superestimada, dizem os pesquisadores dos alimentos. Romântico e profundamente prazeroso, sim, especialmente por causa da tendência de derreter na boca à temperatura do corpo. E de fato ele contém alguns químicos como a feniletilamina, que produz a sensação de euforia. Mas um estudo amplamente citado mostrou que uma pessoa de 60 quilos teria que comer 11 quilos de chocolate de uma só vez para alterar significativamente seu humor. Mas quem ficaria de bom humor depois de comer 19,2% do seu peso corporal em chocolate?

Por outro lado, o fondue de chocolate oferecido no cardápio de dia dos namorados no MidAtlantic em Filadélfia vem com uma possível arma secreta para qualquer um que queira deixar um homem no clima para o amor: donuts (rosquinhas). Mas não vá com muita sede ao pote, porque de acordo com um estudo, a resposta sexual masculina aumentava com o aroma de donuts apenas se ele estivesse combinado com o de alcaçuz, o que não é exatamente uma combinação padrão. (A única combinação de fragrâncias que o estudo descobriu ser mais potente é uma talvez bem menos comum: lavanda com torta de abóbora). Entre todas as legiões de supostos afrodisíacos, pouquíssimos foram comprovados cientificamente por causarem efeitos libidinosos duradouros em certas partes do corpo fora o estômago. Mas a última década trouxe novas tentativas de medir a resposta sexual à comida, assim como mais pesquisas por parte de chefs de cozinha e acadêmicos sobre as conexões entre o aroma, a comida, as emoções e a experiência sensual.

A pimenta chili, por exemplo, acelera o pulso e induz ao suor, imitando o estado de excitação sexual, assim como estimulando a liberação de endorfinas, que desempenham um papel importante no prazer sexual, de acordo com Meryl S. Rosofosky, médico e professor adjunto do departamento de Nutrição, Estudo dos Alimentos e Saúde Pública da Universidade de Nova York. Ainda assim, quase qualquer um que diz saber o que é ou não é afrodisíaco, desde abacates até língua de zebra, reconhece que tudo é altamente subjetivo. Como a Dra. Ruth notoriamente declarou: “o órgão sexual mais importante está entre os ouvidos”. A cultura e a tradição têm um papel importante. Alguns alimentos com fama de afrodisíacos, como manjericão, alecrim, mel, uvas e nozes de pinheiro, eram desejados pelos gregos e romanos antigos e europeus medievais por seus grandes poderes libidinosos. Ou, como o foie gras, caviar, trufas e champanhe, eles eram exaltados como presentes românticos por causa de sua raridade e luxo.

Outros, como figos, aspargos e pepinos, há muito são vistos como eróticos por causa de sua semelhança com os órgãos sexuais feminino e masculino. Alguns ingredientes são considerados sensuais por conta de como são comidos, por exemplo, “ao comer juntos de um mesmo prato”, como escreveu Rosofsky no verbete sobre afrodisíacos na “Enciclopédia da Comida e Cultura” (Scribner, 2002), ou, no caso das ostras, “por chupar e sorver de forma sedutora”. Alimentos com nutrientes que podem potencialmente aumentar a fertilidade e a virilidade atraíram mais interesse dos pesquisadores, cozinheiros e praticantes da medicina alternativa nos últimos anos. Entre eles está, novamente, a ostra, que contém zinco, ligado ao aumento da produção de esperma. (Entretanto, uma pessoa deficiente em zinco teria que massacrar enormes quantidades de ostras antes de perceber qualquer diferença.) O alho contém um aminoácido que incentiva a circulação sanguínea e poderia aumentar as ereções, de acordo com Rosofsky.

Há diferenças surpreendentes entre as culturas em relação a que tipos de alimentos são vistos como prazerosos. Rachel S. Herz, uma especialista na psicologia do olfato, escreveu em seu livro “O Aroma do Desejo” (William Morrow, 2007) que os “asiáticos consideram o cheiro de queijo hediondo, mas os ocidentais o veem como algo entre 'comfort food' e uma indulgência suntuosa.” Pesquisadores descobriram fortes ligações entre o aroma, as emoções e a atração sexual. O olfato pode induzir a emoção, que por sua vez detona mudanças neuroquímicas, disse Herz. De todos os sentidos, diz ela, é o único que ultrapassa as partes conscientes do cérebro e vai diretamente para o sistema límbico, a região responsável pela memória básica, motivação e emoção. O olfato evoluiu para encontrar tanto alimento quanto parceiros, e muitas pesquisas descobriram que o odor do corpo desempenha um papel poderoso na atração humana. O desejo por comida atua de forma muito semelhante no centro de prazer do cérebro, e também imita a atividade neurológica que ocorre quando os viciados precisam de uma dose de álcool ou drogas.

Em um pequeno experimento sobre a resposta sexual ao aroma dos alimentos, o fluxo sanguíneo vaginal e peniano foi medido em 31 homens e mulheres que usaram máscaras que emitiam vários aromas de alimentos. Este foi o estudo que descobriu que os homens são suscetíveis ao aroma de donuts misturado com alcaçuz. Para as mulheres, o primeiro lugar entre os aromas mais excitantes ficou empatado entre talco de bebê e uma combinação de balinhas Good & Plenty com pepino. Em segundo lugar, veio uma combinação da Good & Plenty com pão de banana e nozes. O estudo, conduzido pela Smell and Taste Research Foundation de Chicago, também descobriu que o aroma de cerejas causava uma queda drástica na excitação entre as mulheres, assim como o cheiro de carne na brasa. Alan R. Hirsch, que conduziu os experimentos, disse que as respostas não provaram que o cheiro de torta de abóbora é uma resposta fisiológica arraigada que levaria o homem comum a desfrutar dos benefícios do aumento do fluxo sanguíneo peniano. De fato, ele sugeriu, os aromas poderiam ter invocado memórias poderosas nesta pequena amostra de pessoas, como um caso de amor no de dia de Ação de Graças há muitos anos atrás, ou uma experiência ruim com cerejas.

Herz disse que o estudo era muito limitado para dar crédito a qualquer conclusão, mas ela concorda com a visão de que as experiências passadas com o aroma são fundamentais. “Quando sentimos cheiros almiscarados, pensamos em sensualidade”, disse. “Na América do Sul, produtos de limpeza são feitos com almíscar, então quando uma mulher sente cheiro de almíscar, ela tem mais chances de pensar em produtos de limpeza do que em lingerie.” Herz chama o processo no qual os aromas se tornam positiva ou negativamente arraigados na memória de “aprendizado associativo do odor”. O cheiro de hospital pode levar ao que ela chama de “preocupação com a cirurgia”, enquanto o cheiro de donuts e croissants gera sentimentos de conforto ou satisfação.

Descobriu-se que o cheiro de coisas assadas têm associações tão positivas para os norte-americanos que algumas empresas, usando uma estratégia cada vez mais comum conhecida como marketing do aroma, lançam o cheiro de cookies de chocolate ou outros aromas agradáveis em seus estabelecimentos para criar sentimentos felizes que, esperam, levem as pessoas a gastar. A memória nostálgica desencadeada pelos aromas, conhecida como Efeito Proustiano, foi adotada por alguns chefs que acreditam que comer deve ser uma experiência sensorial completa, envolvendo o gosto, o aroma e até mesmo o som. Heston Blumenthal, do Fat Duck em Bray, Inglaterra, convida os clientes a escreverem memórias de comida da infância e usa essas ideias como inspiração para seus pratos. Grant Achatz, do Alinea em Chicago, já serviu alimentos em pedaços de madeira queimados, sobre um véu de folhas de eucalipto e em travesseiros cheios de ar aromatizado com lavanda, café ou zimbro. Ele derrama água quente sobre o feno e usa o líquido para evocar a memória de passeios no campo (ou, talvez, de rolar no feno, dependendo do jantar).

Parece pouco provável que esses restaurantes façam um menu de Dia dos Namorados, mas seria um bom conselho para aqueles que o fazem que complementem o romance com um pouco de bom senso. No Bar Americain em Manhattan, por exemplo, o menu dos namorados incluirá ostras com menta mignonette; filé mignon com especiarias, hash browns (espécie de bolinhos fritos de batata) e molho; e torta “red velvet”.

Amy Reiley, consultora de restaurantes e autora de livros de cozinha especializada em alimentos e vinhos sensuais, disse que aprecia a inclusão de ostras e menta. Mas, ela disse, “este é o tipo de comida que faz com que você queira dormir depois, e não dançar aquele tchá-tchá-tchá na horizontal.” Da mesma forma, o jantar planejado no MidAtlantic é “pesado demaaaais para uma celebração pré-coito”, escreveu ela numa mensagem de e-mail. Além da sobremesa de donut, ele tinha ostras, filé, batatas, couve-flor gratinada e, na opinião dela, muita proteína e amido para sair de um jantar com energia suficiente para levar a cabo segundas intenções.

Reiley, autora de um livro de receitas estruturado como “A Alegria do Sexo”, sugere que os restaurantes que queiram servir um menu verdadeiramente carnal optem pela guacamole, e não só porque os abacates são há muito considerados afrodisíacos. “Para mim, um dos atributos de maior sucesso de uma refeição afrodisíaca são as cores, os aromas, sabores e texturas que despertam o palato e desafiam a mente”, disse ela. “Guacamole, na forma como é tipicamente servida, oferece uma cobertura aveludada para os salgados crocantes, um acompanhamento frio, escorregadio e sensual para os burritos e tortas.”

Ela também gosta de usar bastante açafrão, menta e baunilha, todos ingredientes que considera afrodisíacos e, é claro, pimenta chili. E como Reiley escreve em seu livro de receitas: “Vinho é um afrodisíaco. Aí está. Ponto final.” Mas qualquer um que siga essa dica também deveria ter em mente o alerta de Shakespeare em Macbeth: o álcool “incita o desejo, mas acaba com o desempenho.”

Tradução: Eloise De Vylder