domingo, 14 de fevereiro de 2010

The New York Times 14/02/2010

Comidas afrodisíacas não tem respaldo científico Sarah Kershaw

Casais que pretendem levar o jantar do Dia de São Valentim [o dia dos namorados nos EUA e Europa] a uma conclusão satisfatória podem ficar tentados pelo menu especial oferecido pelo restaurante One if by Land, Two if by Sea em Manhattan e, em particular, pela sobremesa Floresta Negra. É uma barra de brownie de chocolate e pistache com palitinhos de chocolate merengue, creme fresco, sorvete, gel de cereja e cerejas doces. Mas atenção! Um estudo descobriu que o cheiro das cerejas diminui significativamente o desejo sexual nas mulheres. Há outro problema com a Floresta Negra e as zilhões de outras formas de chocolate que serão consumidas neste fim de semana: a reputação do chocolate como afrodisíaco é superestimada, dizem os pesquisadores dos alimentos. Romântico e profundamente prazeroso, sim, especialmente por causa da tendência de derreter na boca à temperatura do corpo. E de fato ele contém alguns químicos como a feniletilamina, que produz a sensação de euforia. Mas um estudo amplamente citado mostrou que uma pessoa de 60 quilos teria que comer 11 quilos de chocolate de uma só vez para alterar significativamente seu humor. Mas quem ficaria de bom humor depois de comer 19,2% do seu peso corporal em chocolate?

Por outro lado, o fondue de chocolate oferecido no cardápio de dia dos namorados no MidAtlantic em Filadélfia vem com uma possível arma secreta para qualquer um que queira deixar um homem no clima para o amor: donuts (rosquinhas). Mas não vá com muita sede ao pote, porque de acordo com um estudo, a resposta sexual masculina aumentava com o aroma de donuts apenas se ele estivesse combinado com o de alcaçuz, o que não é exatamente uma combinação padrão. (A única combinação de fragrâncias que o estudo descobriu ser mais potente é uma talvez bem menos comum: lavanda com torta de abóbora). Entre todas as legiões de supostos afrodisíacos, pouquíssimos foram comprovados cientificamente por causarem efeitos libidinosos duradouros em certas partes do corpo fora o estômago. Mas a última década trouxe novas tentativas de medir a resposta sexual à comida, assim como mais pesquisas por parte de chefs de cozinha e acadêmicos sobre as conexões entre o aroma, a comida, as emoções e a experiência sensual.

A pimenta chili, por exemplo, acelera o pulso e induz ao suor, imitando o estado de excitação sexual, assim como estimulando a liberação de endorfinas, que desempenham um papel importante no prazer sexual, de acordo com Meryl S. Rosofosky, médico e professor adjunto do departamento de Nutrição, Estudo dos Alimentos e Saúde Pública da Universidade de Nova York. Ainda assim, quase qualquer um que diz saber o que é ou não é afrodisíaco, desde abacates até língua de zebra, reconhece que tudo é altamente subjetivo. Como a Dra. Ruth notoriamente declarou: “o órgão sexual mais importante está entre os ouvidos”. A cultura e a tradição têm um papel importante. Alguns alimentos com fama de afrodisíacos, como manjericão, alecrim, mel, uvas e nozes de pinheiro, eram desejados pelos gregos e romanos antigos e europeus medievais por seus grandes poderes libidinosos. Ou, como o foie gras, caviar, trufas e champanhe, eles eram exaltados como presentes românticos por causa de sua raridade e luxo.

Outros, como figos, aspargos e pepinos, há muito são vistos como eróticos por causa de sua semelhança com os órgãos sexuais feminino e masculino. Alguns ingredientes são considerados sensuais por conta de como são comidos, por exemplo, “ao comer juntos de um mesmo prato”, como escreveu Rosofsky no verbete sobre afrodisíacos na “Enciclopédia da Comida e Cultura” (Scribner, 2002), ou, no caso das ostras, “por chupar e sorver de forma sedutora”. Alimentos com nutrientes que podem potencialmente aumentar a fertilidade e a virilidade atraíram mais interesse dos pesquisadores, cozinheiros e praticantes da medicina alternativa nos últimos anos. Entre eles está, novamente, a ostra, que contém zinco, ligado ao aumento da produção de esperma. (Entretanto, uma pessoa deficiente em zinco teria que massacrar enormes quantidades de ostras antes de perceber qualquer diferença.) O alho contém um aminoácido que incentiva a circulação sanguínea e poderia aumentar as ereções, de acordo com Rosofsky.

Há diferenças surpreendentes entre as culturas em relação a que tipos de alimentos são vistos como prazerosos. Rachel S. Herz, uma especialista na psicologia do olfato, escreveu em seu livro “O Aroma do Desejo” (William Morrow, 2007) que os “asiáticos consideram o cheiro de queijo hediondo, mas os ocidentais o veem como algo entre 'comfort food' e uma indulgência suntuosa.” Pesquisadores descobriram fortes ligações entre o aroma, as emoções e a atração sexual. O olfato pode induzir a emoção, que por sua vez detona mudanças neuroquímicas, disse Herz. De todos os sentidos, diz ela, é o único que ultrapassa as partes conscientes do cérebro e vai diretamente para o sistema límbico, a região responsável pela memória básica, motivação e emoção. O olfato evoluiu para encontrar tanto alimento quanto parceiros, e muitas pesquisas descobriram que o odor do corpo desempenha um papel poderoso na atração humana. O desejo por comida atua de forma muito semelhante no centro de prazer do cérebro, e também imita a atividade neurológica que ocorre quando os viciados precisam de uma dose de álcool ou drogas.

Em um pequeno experimento sobre a resposta sexual ao aroma dos alimentos, o fluxo sanguíneo vaginal e peniano foi medido em 31 homens e mulheres que usaram máscaras que emitiam vários aromas de alimentos. Este foi o estudo que descobriu que os homens são suscetíveis ao aroma de donuts misturado com alcaçuz. Para as mulheres, o primeiro lugar entre os aromas mais excitantes ficou empatado entre talco de bebê e uma combinação de balinhas Good & Plenty com pepino. Em segundo lugar, veio uma combinação da Good & Plenty com pão de banana e nozes. O estudo, conduzido pela Smell and Taste Research Foundation de Chicago, também descobriu que o aroma de cerejas causava uma queda drástica na excitação entre as mulheres, assim como o cheiro de carne na brasa. Alan R. Hirsch, que conduziu os experimentos, disse que as respostas não provaram que o cheiro de torta de abóbora é uma resposta fisiológica arraigada que levaria o homem comum a desfrutar dos benefícios do aumento do fluxo sanguíneo peniano. De fato, ele sugeriu, os aromas poderiam ter invocado memórias poderosas nesta pequena amostra de pessoas, como um caso de amor no de dia de Ação de Graças há muitos anos atrás, ou uma experiência ruim com cerejas.

Herz disse que o estudo era muito limitado para dar crédito a qualquer conclusão, mas ela concorda com a visão de que as experiências passadas com o aroma são fundamentais. “Quando sentimos cheiros almiscarados, pensamos em sensualidade”, disse. “Na América do Sul, produtos de limpeza são feitos com almíscar, então quando uma mulher sente cheiro de almíscar, ela tem mais chances de pensar em produtos de limpeza do que em lingerie.” Herz chama o processo no qual os aromas se tornam positiva ou negativamente arraigados na memória de “aprendizado associativo do odor”. O cheiro de hospital pode levar ao que ela chama de “preocupação com a cirurgia”, enquanto o cheiro de donuts e croissants gera sentimentos de conforto ou satisfação.

Descobriu-se que o cheiro de coisas assadas têm associações tão positivas para os norte-americanos que algumas empresas, usando uma estratégia cada vez mais comum conhecida como marketing do aroma, lançam o cheiro de cookies de chocolate ou outros aromas agradáveis em seus estabelecimentos para criar sentimentos felizes que, esperam, levem as pessoas a gastar. A memória nostálgica desencadeada pelos aromas, conhecida como Efeito Proustiano, foi adotada por alguns chefs que acreditam que comer deve ser uma experiência sensorial completa, envolvendo o gosto, o aroma e até mesmo o som. Heston Blumenthal, do Fat Duck em Bray, Inglaterra, convida os clientes a escreverem memórias de comida da infância e usa essas ideias como inspiração para seus pratos. Grant Achatz, do Alinea em Chicago, já serviu alimentos em pedaços de madeira queimados, sobre um véu de folhas de eucalipto e em travesseiros cheios de ar aromatizado com lavanda, café ou zimbro. Ele derrama água quente sobre o feno e usa o líquido para evocar a memória de passeios no campo (ou, talvez, de rolar no feno, dependendo do jantar).

Parece pouco provável que esses restaurantes façam um menu de Dia dos Namorados, mas seria um bom conselho para aqueles que o fazem que complementem o romance com um pouco de bom senso. No Bar Americain em Manhattan, por exemplo, o menu dos namorados incluirá ostras com menta mignonette; filé mignon com especiarias, hash browns (espécie de bolinhos fritos de batata) e molho; e torta “red velvet”.

Amy Reiley, consultora de restaurantes e autora de livros de cozinha especializada em alimentos e vinhos sensuais, disse que aprecia a inclusão de ostras e menta. Mas, ela disse, “este é o tipo de comida que faz com que você queira dormir depois, e não dançar aquele tchá-tchá-tchá na horizontal.” Da mesma forma, o jantar planejado no MidAtlantic é “pesado demaaaais para uma celebração pré-coito”, escreveu ela numa mensagem de e-mail. Além da sobremesa de donut, ele tinha ostras, filé, batatas, couve-flor gratinada e, na opinião dela, muita proteína e amido para sair de um jantar com energia suficiente para levar a cabo segundas intenções.

Reiley, autora de um livro de receitas estruturado como “A Alegria do Sexo”, sugere que os restaurantes que queiram servir um menu verdadeiramente carnal optem pela guacamole, e não só porque os abacates são há muito considerados afrodisíacos. “Para mim, um dos atributos de maior sucesso de uma refeição afrodisíaca são as cores, os aromas, sabores e texturas que despertam o palato e desafiam a mente”, disse ela. “Guacamole, na forma como é tipicamente servida, oferece uma cobertura aveludada para os salgados crocantes, um acompanhamento frio, escorregadio e sensual para os burritos e tortas.”

Ela também gosta de usar bastante açafrão, menta e baunilha, todos ingredientes que considera afrodisíacos e, é claro, pimenta chili. E como Reiley escreve em seu livro de receitas: “Vinho é um afrodisíaco. Aí está. Ponto final.” Mas qualquer um que siga essa dica também deveria ter em mente o alerta de Shakespeare em Macbeth: o álcool “incita o desejo, mas acaba com o desempenho.”

Tradução: Eloise De Vylder


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